segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Pela hora da morte

Ai esta vida! - "Está pela hora da morte!"
O que eu fazia se tivesse mais tempo! - "O tempo? Ai, está pela hora da morte!"
E o estado deste tempo, só chuva! - "Mas a chuva é bom, se não fica tudo pela hora da morte!"

Olha e a vida? - "A vida, claro que está pela hora da morte, não vês as notícias?"

Não, eu vivo no dia-a-dia~, na vida, não na hora da morte...

domingo, 28 de outubro de 2012

Sê feliz, sê criança

 

Troca o passo, volta atrás, olha o sapato está desapertado! Não importa, corre mais, vira à esquerda, contorna a casa, assusta alguém! Ri-te, tropeça, não tenhas medo de cair. Tira os sapatos, atira-os ao ar. Foge da tua sombra, corre mais depressa, depois mais devagar. Dá um salto no ar, iça esses calcanhares e bate com os pés no chão! Sê feliz, sê criança.
 

Imagem: http://vblogue.blogspot.pt/2011/01/para-soprar-e-fazer-bolas-pequenas-e.html

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Bagagem



Vejo a história da minha vida como bagagem. São várias malas que vou carregando. Às vezes pesam mais. Ainda assim, com o passar do tempo vão pesando menos. Estão em carruagens e as rodas que as suportam estão cada vez melhores. Assim vou rolando melhor, sem parar tanto no caminho.
Mas às vezes tenho de parar porque uma mala que eu achava que estava tão bem arrumadinha e tão bem fechadinha, rebenta! E instala-se o caos! Vejo roupa que já não via há anos. Sinto aquilo que devia de ter sentido quando as vesti, e assusto-me. Parece ser demais, tecido que dança à minha volta, que se mistura com as rodas e faz parar o comboio. Peça a peça, tento arrumar a mala. É um processo demorado. Terá de demorar o tempo necessário para que fique tudo arrumado e seja possível voltar a abrir com gentileza a mala, no futuro. Deixar a roupa disponível.
E quando for possível, posso voltar ao caminho ou ir um pouco mais depressa, avançando pelos carris, tendo atenção às pedras e revendo as fechaduras das malas. A manutenção destas malas é coisa importante…

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Maus tempos



Pudessem as pessoas não culpar o tempo dos sentimentos que brotam! Têm costas largas estas nuvens... É muito culpada esta humidade, e a escuridão? É por eles que estão todos assim, cinzentos.


domingo, 21 de outubro de 2012

Mudança

"A dor e o desconforto potenciam a mudança"

Apesar das aspas não me lembro se a frase era assim. Se nos dói a perna que se dobra sobre a outra, então descruzamos as pernas. A dor potencia a transição. O problema é quando permanecemos na dor porque isso parece ser mais confortável do que saltar para o desconhecido...

sábado, 6 de outubro de 2012

Estores



É que é mais fácil deixar resvalar os estores para a sombra do que fazer o esforço de os puxar para deixar entrar a luz. Deixar entrar a luz requer mais esforço, temos de fazer força, puxar, mas as consequências são bem melhores do que deixar os estores caírem na noite. Não é?



Imagem: http://www.mocambiquetrading.com/areas-de-negocios/diversos/potencial-negocio-para-fabrica-de-estores/

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Paciências

Entro na conservatória. Preciso de levantar um documento que pedi na semana passada. Tiro a senha respectiva, sento-me e vejo que, apesar de ser a próxima para levantamento de documentos, existem algumas pessoas a pedir documentos. Só estão dois guichets a funcionar. Suspiro e penso "parece que vai ser mais demorado levar o documento do que pedi-lo...".

Uma senhora está a fazer o cartão do cidadão. Fala lentamente. A senhora da conservatória pede-lhe a morada. A senhora do cartão diz calmamente "mas eu tenho duas casas". A resposta é pronta e ainda assim paciente e simpática: "Mas a senhora é que tem de me dizer qual é a morada que quer. Olhe que é a morada que fica nas finanças, na Segurança Social...". A senhora do cartão dá um código postal, optando por uma das casas. Ainda preocupada, a senhora da conservatória pergunta-lhe qual é a morada na carta de condução indicando: "Olhe que tem de ter a mesma morada na carta e no cartão do cidadão, senão, se é mandada parar é multada, porque a morada tem de coincidir!". A senhora do cartão responde um prolongado "o que é que acha". "Você é que sabe, não posso dizer qual deve ser", responde, ainda com paciência, a senhora da conservatória. A senhora do cartão opta pela morada da carta de condução. E assim avança o processo.

Eu vou assistindo calmamente, penso que tenho tempo, apesar de nunca gostar de esperar, sem nada para fazer. Começo a observar os restantes cidadãos que esperam. São três. Um casal com senhas e uma senhora com hora marcada. Começam a ficar impacientes. O casal muda de lugar e a senhora de hora marcada vai balançando a perninha enquanto reúne os seus documentos e se perde a olhar para a sua carta de condução. Talvez a fotografia fosse antiga. Não sei, não consigo ver, estou mais afastada mas consigo ver o desenrolar da história.

A seguir vem a máquina esquisita: "Agora vai se levantar, vai ali para aquela máquina e olha em frente." - explica a senhora da conservatória com aquela voz de quem diz a mesma frase várias vezes ao dia. A fotografia corre bem. De seguida é pedido à senhora do cartão que coloque os dedos indicadores na máquina esquisita. Calmamente a senhora diz que não está a funcionar. A senhora da conservatória lá se levanta do seu lugar imaculado e ajuda no processo. Não percebi o que terá acontecido, se a senhora do cartão não carregou bem ou se houve algum problema informático.

Agora estamos na recta final, o casal e a senhora da hora marcada trocam olhares e risos sobre a senhora do cartão. Afinal de contas está a demorar. Leio naqueles risos a paciência sem compaixão, de quem diz "remédio esperar, mas esta senhora é muito tonta!"

Eu observo. E agora passamos para a parte em que a senhora tem de assinar na máquina esquisita para que possa digitalizar a sua assinatura. Ela demora. Volta da máquina esquisita e senta-se novamente em frente à senhora da conservatória. A senhora do cartão diz, mal se senta:"Sabe, é que eu tenho dificuldade em assinar, tive um AVC há pouco tempo..."

E agora é a minha vez de ser atendida. Com mais compaixão.