quinta-feira, 15 de maio de 2014

Futebol Psicossomático


Com a derrota de ontem, vi surgirem, como aliás já é moda, muitos comentários de adeptos de outros clubes que não o Benfica e que eram claramente para vilipendiar o glorioso. Antes de continuar quero apenas esclarecer que não gosto de futebol, mas gosto do Benfica. É uma mística, uma energia familiar, algo que tenho muito orgulho em partilhar com vários elementos da família e que não se explica, sente-se. Para além de ser Benfiquista, não gosto de injustiças nem de ver os jogos (fico enervada, que querem?). Ah, se calhar é melhor também acrescentar que apesar de não gostar de futebol, mas gostar do Benfica, percebo efectivamente um pouco de futebol (sim, sei ver quando há um fora de jogo, acho que isso me eleva a uma connaisseur). E então, quando vejo penaltis não marcados, malta à bulha nas 4 linhas e fora delas, desisto de ver o jogo e vou fazer qualquer outra coisa com melhores energias.

Colocando assim esta breve introdução, venho então falar sobre aquelas pessoas que, sendo adeptos de outros clubes, deliram com as derrotas dos seus adversários, ainda que sejam noutras ligas que não as suas. E aqui também existem Benfiquistas, claro, estas pessoas existem em todo o lado. É como as famílias, ninguém tem uma perfeita.

Na minha opinião terapêutica, vejo de antemão uma pessoa que se alegra com a tristeza dos outros, e isto já poderá dizer muito sobre os seus princípios e o seu modus operandi. De facto, parece-me que existem motivos psicológicos por detrás desta temática que, com um pouco de compaixão, nos pode permitir entender estas pobres almas e, quiçá, perdoar as tonterias que dizem. Aparentemente, a sua sensação de felicidade ou de satisfação prende-se com a insatisfação ou a dor dos outros, algo que até pode parecer meio psicopático. Ou apenas muito triste.

No fundo, esta tentativa de melindrar o outro quando ele está em baixo é não só um acto de cobardia como também uma demonstração de que existe uma enorme tristeza nessa pessoa que acaba por ser catapultada para o exterior numa forma jocosa. E a tristeza, não sei se sabem, mas é a base de muitas sensações de raiva.

Ora aqui reside o nosso busilis: a expressão da raiva não é algo que possa ser feito de forma construtiva na sociedade moderna, e ainda menos na sociedade portuguesa onde se prega o fado e o "come e cala". Assim sendo, como não é possível expressar a raiva que nos assola no dia a dia, seja com gritos, esperneando ou ameaçando alguém de pancada (não fica bem...), vamos engolindo essas sensações. E aqui entra a psicossomatização. Se estas sensações não saem, elas, em forma de energia, vão assolar outras partes do nosso corpo e podem ser encontradas nas pedras na vesícula, problemas de fígado, ou até mesmo num excesso de tensão no maxilar. Neste último podemos ver os seus resultados com a sensilibidade dentária (perdemos o esmalte com a força que fazemos com os dentes) ou com as constantes dores no maxilar de tanta força que fazemos.

Caso o problema seja verbal, ou seja, caso estejamos a viver uma situação em que queremos expressar vocalmente a nossa raiva e não podemos, então os sintomas somáticos podem surgir a nível da garganta. Sim, é aquela sensação de uma bola, que não sobe nem desce. Mas também pode ser dor de garganta, amígdalas inflamadas ou uma constipação que aparece por magia.

Quando se fala de somatização, fala-se também de responsabilidade pela doença que surge. Fomos nós que a criámos. É claro que possivelmente muitos de vocês leram o que escrevi e pensaram que é tudo um monte de treta. E é, de facto, para quem, como bom Português gosta de se desresponsabilizar pelo seu corpo, por si e pelo seu pais, algo que tem sido tão visível.

Por isso, meus caros, quando a vossa equipa perder, deitem isso cá para fora, porque deitar em forma de vilipêndio para os adversários de outras ligas pode ser pior... Pela vossa saúde!

Imagem: http://blogs.estadao.com.br/cristina-padiglione/premiere-futebol-clube-fecha-ano-abaixo-das-metas/

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Os cursos de preparação para o parto

Quando cheguei ao segundo trimestre de gravidez, comecei calmamente à procura de cursos de preparação para o parto. Verifiquei alguns pontos em comum, nomeadamente o início, que seria pelas 28/30 semanas e o preço, sempre perto dos 200€. As aulas teriam sempre uma regularidade semanal e as diferenças entre os cursos versavam sobre detalhes relacionados com o conteúdo, a existência de aulas de pós-parto, entre outros.

Entretanto, numa visita à Prenatal (qual é a grávida que não passa lá?), inscrevemo-nos em dois mini-cursos de uma hora cada, completamente gratuitos, um que ocorreu nesta altura, e o segundo aos 7 meses. Devo confessar que não tinha grandes expectativas e fui alegremente bafejada por bons conselhos, embora curtos, que me permitiram pesquisar mais informação, sem medos e já com algumas bases. Tratou-se de um curso básico e breve mas com indicações precisas que me permitiram por exemplo, começar a pensar na mala de maternidade e noutros detalhes que tendencialmente deixamos para mais tarde. Assim a ideia foi-se implantando, com calma e sem stress. E penso que esta foi uma das coisas que gerimos bem: a informação que nos chega. Não é preciso entrar em pânico, temos muitos meses pela frente para ir lendo e procurando a informação mais acertada, sem stress.

Ainda durante o segundo trimestre, surgiu a oportunidade de fazer um curso de preparação para o parto com uma Doula. Este seria num regime intensivo (3 dias inteiros) e num registo diferente, mais associado ao parto humanizado. Lançamo-nos a este curso com bastante vontade e foi de facto revelador. Confesso que também foi muito bom o facto de ter sido cedo, pois isso permitiu encaixar melhor toda a informação que recebemos de jorro em apenas 3 dias.

Tanto eu e o meu marido temos algo que considero uma grande qualidade: ouvimos e lemos várias coisas, digerimos, debatemos os dois e tiramos as nossas conclusões. Desta forma foi possível encontrar o nosso equilíbrio sobre a nossa própria preparação como indivíduos para esse momento transitório e transformador como o parto. Assim sendo, neste curso recebemos muita informação de que não esperávamos, sobre os hospitais, sobre o parto em casa, o parto humanizado, entre outros temas. E fazer este curso não iria inviabilizar a nossa vontade de fazer um curso dito "normal" de preparação para o parto, com uma enfermeira ou fisioterapeuta.

Mas este curso foi o turning point. Foi aqui que começámos a perceber que existe muita informação bipolar, e a par da quantidade de informação, muitas pessoas nos dois extremos da jangada a acenar para os pais grávidos dizendo que o seu lado é o melhor. É claro que quantos mais ficam de pé num dos lados, mais depressa a jangada se afunda... E assim sendo, nós cá gostamos muito de estar no meio, no nosso lugar, com as nossas ideias e bebendo do que há de melhor dos dois lados da barricada.

Demorou algum tempo encaixar a informação dada neste curso: valerá a pena fazer um plano de parto e enviar ao hospital? Será que vou ter sorte com a equipa no dia do parto ou será que me vão vilipendiar de todas as formas possíveis e imaginárias? Não foi fácil, mas foi claramente necessário e possibilitou a abertura de novas portas e a recepção de novos conhecimentos.

Continuei então à procura de um curso de preparação para o parto para complementar com o anterior. E o que me apercebi é que não existe assim tanta oferta quanto isso, e que, de facto, o decréscimo no número de grávidas faz com que existam poucas "turmas" a abrir ou pouca disponibilidade para cursar apenas um casal. Mas como nada acontece por acaso, encontrei um sítio onde o curso é mais barato, é mais perto de casa e é dado a um ou dois casais, sendo que no nosso caso ficámos sozinhos mas felizes. Fomos a poucas aulas, mas gostámos e ao contrário de outros cursos com limitação de horas/aulas, aqui vamos estar acompanhados até ao nascimento.

No final de contas, acho que a melhor preparação é de nós para nós, pois como sabiamente ouvi dizer "80% do parto ocorre entre as orelhas", pelo que a parte mental deve ser domada, e aí várias áreas terapêuticas podem intervir. E se demasiada informação não for demais, aconselho vivamente a fazer terapia neste momento, assim como assistir aos diversos cursos que se fazem, dos mais práticos aos mais profundos. E no fim, e aí será o mais importante, cozinhem tudo e façam um prato ao vosso gosto, que é como quem diz, sejam inteligentes, pensem por vocês e cheguem às vossas conclusões, que devem ser baseadas nas vossas necessidades, respeitando sempre a vossa individualidade.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Ser mulher



Diz-se que a sociedade impõe aos meninos que não chorem, que não demonstrem fragilidades e que sejam Homens, com H grande, com capacidade para lidar com a vida de uma forma quase bélica, mas também quase heróica e altruísta (este último, qb).

Dei por mim a pensar nisto e a perceber que está incompleto. Isto também acontece no feminino. Pelo menos, e de forma subtil, foi o que me chegou: tenho de me esforçar sempre para estar a postos para qualquer luta que surja; não posso baixar os braços, tenho de tentar sempre estar entre os melhores; não posso fraquejar e muito menos ser frágil ou desistir.

Não sei se é algo português, se é uma imposição apenas da minha geração, ou talvez da minha área geográfica (teria de fazer uns inquéritos!), mas o que é facto é que a mulher também tem de ser forte. Esta e outras imposições externas, tanto nos homens como nas mulheres, traduz-se numa enorme rigidez,seja ela de movimentos, de emoções, ou de pensamentos condicionados. E com isto andamos todos e todas a neurotizar e a perguntar: porque é que nunca me sinto satisfeito? Porque é que não me sinto plena? A resposta nunca é fácil, e como sempre, é preciso ultrapassar o sintoma e ir à origem.

Com a gravidez, como é óbvio, este tema intensifica-se. Queremos acompanhar a nossa neurose e o corpo não vem connosco. Queremos continuar à mesma velocidade, fazer cinquenta coisas ao mesmo tempo (o cérebro feminino é multi-pista, nunca se esqueçam) e não é humanamente possível. Gravidez não é, efectivamente doença (lá está mais um clichet metido à bruta pela sociedade e que faz com que a grávida não se queixe), mas o estado de graça por vezes não tem nada de engraçado e é necessário saber quando parar ou abrandar.

E com isto tudo, esquecemo-nos do mais importante: não existem duas mulheres iguais e não existem duas gravidezes iguais, logo, a experiência de uma não é, nem pode ser, a experiência da outra. Então, vemo-nos numa encruzilhada: a sociedade diz que temos de ser fortes e aguentar o mais possível, o nosso corpo diz-nos "nem pensar", as nossas emoções ficam todas baralhadas e a mente só complica, com os seus filmes e ideias, histórias e crenças... E foi nesta encruzilhada que me deparei com a frase em cima, parece que de facto nada é por acaso, e surgiu na melhor altura. Temos de tratar de nós, olhar seriamente para a nossa saúde (física e mental) e reflectir bastante sobre estas encruzilhadas da vida. E digo reflectir para avançar, e não mastigar na neurose algo que os nossos dentes já não mordem.

Foto: https://www.facebook.com/HuffPostWomen/photos/a.196854310382630.47501.153213781413350/651692994898757/?type=1