Conforme vou passeando pela vida, vou percebendo cada vez melhor que não devemos fazer julgamentos sobre os outros sem termos passado pelas mesmas situações que julgamos. É como dizem os estrangeiros: não falar sem ter calçado os sapatos do outro e ter andado uns bons metros. Bem, melhor é mesmo não existir julgamento, ponto. Vamos então trocar as palavras, em vez de julgamento vou referir o seguinte: cada vez percebo melhor que não devemos opinar sobre situações sobre as quais não passámos.
Falar do outro é fácil. Dar conselhos, ideias, dicas, é tão fácil que é de graça. Estes conselhos não pedem licença, não batem à porta, e mesmo que não sejam bem vindos, eles entram à força sem bater, sentam-se no nosso sofá, metem os pés em cima da mesa e ainda perguntam se o cafézinho demora muito. São invasivos, ponto. E eu não gosto.
Lidar com este tipo de situações é uma viagem com altos e baixos e se num dia corre bem e a forma como respondemos se chama assertividade, no outro chama-se irritação e leva a outra coisa chamada discussão. Quando são um pouco, vá, aguerridos como eu, existem limites que estamos constantemente a demonstrar aos outros. Claro que por vezes apetece sacar de um giz e fazer uma linha no chão para ver se o outro percebe. Ainda assim, colocar limites é um trabalho activo que exige muito de nós: exige atenção constante e uma energia pacificadora que dê a uma invasão uma resposta assertiva.
E o que é ser assertivo? É expor, de forma afirmativa e não arrogante, aquilo que queremos transmitir ao outro. É o ténue equilíbrio entre o "opá, não digas isso" e o "dizes isso outra vez e..." Será o "não deves dizer isso sobre algo que desconheces e para o qual não tens qualquer posição criativa de resposta". Sei lá, qualquer coisa assim, louca.
Como nem sempre é possível ser assertivo, por vezes a vontade é a de mostrar o middle finger e mandar toda a gente obrar. É aquele momento em que os cabelinhos da nuca ficam eriçados com tamanha desfaçatez relativamente ao que nos é transmitido. E para quem insiste, apenas posso referir: se não calçam o 39, não são Ananicas, e não têm a minha vida, então cheguem para lá, que os meus sapatos não vos servem. Mas enfim, resta esperar pelos dias de Buda em que podemos mandar todos passear em paz.