Sim, é certo que a morte deve ser respeitada, principalmente
tendo em consideração a família e amigos dos falecidos, pois esses ficam, ouvem e leem o que não querem. Não rejubilo a morte de quem não gosto, mas
respeito-a em todas as situações. No entanto, seguindo o ideal de “nem tanto ao
mar, nem tanto à terra”, não acho que uma pessoa, só porque morre, vira santa,
anjo ou coisa que o valha. E isto é de facto uma atitude muito comum nas aldeias. Ora, como em tempo de crise o país encolheu para este estatuto de "aldeia", parece que tudo o que morre merece estátua.
A morte é um momento de dor para quem a assiste de perto. É
algo de desconhecido para quem vai de barco para atravessar esse rio de
mistério, em que não sabemos onde vamos desaguar. É algo que sabemos que vai
acontecer mais tarde ou mais cedo, a nós e aos que nos acompanham, mas é um
tema que escondemos debaixo da cama, atrás de uns caixotes de sapatos, que é
para não incomodar muito. Ali ganha cotão, é certo, mas longe da vista, longe
do coração.
Voltando à premissa dos mortos virarem santos, não sei
se não dizem mal dos mortos com medo que venham em formato fantasma. “Era bom
rapaz”, diz uma velhinha sobre o pilha-galinhas da aldeia, atropelado por um tractor
enquanto fugia com o seu galo capão (o maior e mais lindo lá do sítio, digno de
prémios numa Ovibeja… Lá do sítio). Será que ela tem medo que ele a assombre
durante a noite, puxando o canto a um cobertor?
Não vou dizer perentoriamente que não acredito em fantasmas,
mas acredito que esses tipos teriam outras prioridades, caso voltassem depois mortos
para arreliar as pessoas. Assim sendo, e sem ter em conta a teoria do fantasma, não percebo porque se santifica alguém desconhecido. Não sabemos, aliás, quando o destino de quem parte, embora existam as mais diversas opções, tantas quantas religiões.
Melhor, melhor, seria que todos fossemos santificados ao morrer, mas por motivos nobres e correctos, e assim saberiamos que estavamos a deixar um mundo terreno melhor... Mas isso são outros quinhentos e o que interessa é viver no 8 e no 80: ou se mata o morto, ou se santifica o coitado!