segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Antes e depois

Para muitos de nós, talvez até para a maioria, é muito difícil fazer transições. Existem vários motivos para isso. Fazer uma grande mudança ou transição na nossa vida exige energia, disponibilidade, força e coragem. Exige também um esforço para sair do conhecido, do lugar de segurança. E isso mexe com as necessidades básicas, como humanos, mas também como animais que somos.

Fazer uma mudança ou transição implica fazer um movimento entre dois lugares dentro de nós: o antes e o depois. E se conhecemos muito bem o antes, pouco temos a saber sobre o depois. Claro que, quando a mudança é algo que nós queremos fazer, sabemos para onde queremos ir, e aí temos conhecimento de um "depois" hipotético, mas, se esse "depois" se situa no futuro, existe muito desse "depois" que é desconhecido.


Mas voltemos ao "antes". O antes é o agora com tudo aquilo que o caracteriza, incluindo o conhecimento do passado e uma estabilidade sobre aquilo que se sabe e que é controlado por nós. Há uma segurança no "antes", e mesmo que não estejamos felizes ou que nos sintamos presos a uma estabilidade que nos faz sentir parados e sem evoluir, este momento pré-transitório traduz-se em conforto. Conforto porque sabemos como são os nossos dias, um atrás do outro, quer passe uma semana ou um mês. Conforto porque, mesmo que estejamos fartos deste conhecido, este conhecido está imóvel, não nos surpreende. Claro que estou a falar de momentos internos, endógenos, ou seja, em que não existe algo externo que nos empurra para outras transições na vida, como o desemprego ou uma morte. São aqueles momentos em que vemos a vida repetir-se, dia após dia. E por mais que queiramos sair desse ritmo, por vezes a estagnação é tão forte que é difícil dar um passo.

Quando podemos dar finalmente um passo para o "depois" surge o medo. Por vezes é tão forte que até cremos que mais vale ficar no "antes", infeliz mas seguro. Porque é assim? O "antes" é toda uma vivência, é algo que vive connosco e que, para chegar ao ponto a que chega, precisa de muito tempo, como uma pele que se vai vestindo e que faz parte de nós. Se vamos despir essa pele que nos cobriu durante tanto tempo, vamos ter de nos despedir dela, e aqui reside a grande dificuldade: nas transições há sempre algo que morre. O "antes" morre para dar lugar ao "depois", e é necessário fazer um luto. Vamos abandonar algo que não vamos voltar a ver, seja um emprego, uma pessoa, ou a nossa "antiga" pessoa. E isso dói. O carácter definitivo que por vezes surge, assusta. A novidade assusta. O desconhecido, ainda que tenha uma promessa de felicidade, assusta. Mas às vezes é necessário dar um passo, e não é um passo em falso, é um passo em frente, mesmo que seja em direcção ao nevoeiro. Sabemos que conforme vamos caminhando no nevoeiro, vamos vendo nem que seja um passo em frente. E às vezes mais vale ir andando do que sentar e esperar por um D. Sebastião.

Imagem: http://mesmoquenaohouvessemusicaeuchoraria.blogspot.pt/

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